Fábio defende investimentos, gratuidade e universalidade do SUS

Para encerrar as discussões da Semana da Enfermagem, o presidente da Câmara dos Vereadores de Paulista/PE, Fábio Barros, recebeu a ex-superintendente de Atenção à Saúde do município Ceci Alencar para uma conversa, com a mediação do jornalista Denis Araújo. A discussão se deu em uma transmissão ao vivo no canal do Youtube do vereador no último sábado (23), onde foram tratados os temas da valorização dos profissionais da saúde e o reconhecimento da importância do SUS.

Ao longo de duas horas, a live traz conteúdo esclarecedor a respeito da saúde do país e, em específico, a situação de enfrentamento à pandemia do novo coronavírus no município de Paulista/PE. Antes de adentrar às contextualizações iniciais da temática, Fábio mostra a sua visão dos escândalos políticos que tomam conta do Governo Federal e, como isso tem atrapalhado ações unificadas na busca de resoluções ao processo epidêmico em curso no país.

Já sobre o assunto da live, Denis lembrou da realidade da saúde do Brasil nos anos 70 trazendo uma situação pessoal para introduzir a discussão. Sem o SUS, posto em prática apenas nos anos 90, só poderiam usufruir do serviço de saúde gratuito aqueles que contribuíssem com a previdência social, ou seja, aquelas pessoas que tinham um trabalho formal, com a carteira assinada.

Saúde no Brasil antes e depois do SUS

A partir da experiência trazida, Fábio Barros, que tem formação acadêmica na área da biologia, explica o surgimento do Sistema Único de Saúde, mais conhecido por meio da sigla SUS. O modelo nasceu e ganhou força no período de redemocratização do país, pós ditadura militar. “Com a garantia de direitos humanos, presente nas discussões democráticas, começou a se pensar que as políticas públicas precisavam ser acessíveis para todos”, disse.

No modelo descrito por Denis, anterior à existência do SUS, às pessoas desempregadas, que trabalhavam na informalidade ou não tinham carteira assinada, restava o atendimento nas Santas Casas de Misericórdia, hospitais privados da Igreja Católica. O acesso de pessoas em vulnerabilidade ao atendimento em saúde era dificultado, ou praticamente impossível de ser conseguido pela falta de serviços gratuitos e de qualidade.

Sobretudo a partir da Constituição de 1988 ficou documentado que é dever do Estado garantir saúde pública a todos aqueles que se encontram dentro das fronteiras do país, sendo de nacionalidade brasileira ou não. Mesmo com a possibilidade de contratação de um plano de saúde particular, algumas necessidades, como vacinas, ficam restritas ao controle do SUS, de domínio público, que é responsável por providenciá-las a quem precisar.

Com a participação de movimentos sociais, políticos, profissionais da área da saúde, universidades, e toda a sociedade, envolvidos em diversas conferências, o SUS é composto em um sistema integrado entre as esferas municipal, estadual e federal. “O mecanismo de atendimento criado é dividido em níveis de complexidade, que vai das unidades básicas de saúde, os centros de emergência, como as UPAs, até às unidades de tratamento intensivo”, explicou Fábio.

Dificuldades enfrentadas pelo SUS

O Sistema Único de Saúde é um sistema integrado que dá ao povo brasileiro a oportunidade de ter um atendimento universal. É pelo menos o que promete o modelo estabelecido pelo SUS. Não fossem as dificuldades encontradas principalmente no repasse de recursos do Governo Federal às ações da pasta e das decisões políticas em níveis estadual e municipal, a situação seria diferente.

Ainda no Governo de Michel Temer, em 2016, os investimentos públicos em áreas como saúde, educação, e assistência social, tiveram uma limitação drástica, graças à PEC 55. A medida em vigor alterou a Constituição de 1988 para congelar por 20 anos os gastos públicos nas pastas citadas. A saúde foi afetada violentamente, já que a melhoria do serviço prestado depende da atualização tecnológica de equipamentos e métodos, por exemplo. O Brasil perdeu 20 bilhões em investimentos para a área.

Não bastasse isso, nas mãos do Governo Bolsonaro ultraliberal já se discute a privatização do atendimento à saúde, à medida em que cada vez mais concessões são feitas aos planos de saúde. Nessa lógica, se direciona os serviços de saúde para uma parcela muito pequena da população que pode custear. “É muito estranho, com esse processo, alguém dizer que privatizando a saúde vai melhorar, não vai, vai melhorar para poucos. Como nos Estados Unidos, a pessoa vai pagar caro para ter um serviço de saúde onde tem pessoas que não podem ter serviço nenhum e vão procurar fazer tudo em casa”, disse Fábio.

Situação da saúde de Paulista/PE

A má aplicação dos recursos, mesmo poucos, também prejudica a efetividade do sistema, prejudicando milhares de pessoas, é o que acontece em Paulista/PE com o fechamento de 16 Unidades Básicas de Saúde (UBS). Fábio comparou a situação a de outras cidades próximas. “Nenhuma cidade de grande porte da RMR fechou unidades de saúde, pelo contrário, em Recife criaram-se novas unidades, centros de referência a mais para que a população saiba como ser atendida, como fazer, onde buscar assistência”, explicou.

Ceci Alencar, enfermeira formada pela Universidade Federal de Pernambuco e com vasta experiência na saúde do município também comentou a situação. “As unidades de saúde da família são essenciais para a atenção primária. Elas transformaram o atendimento do SUS porque são coordenadoras do cuidado e têm uma capilaridade muito grande nas camadas da população, nas comunidades. Por isso vejo com muito espanto o fechamento de unidades. O caminho é construir metodologias novas, porque a Covid tá exigindo isso, construir novas tecnologias, reorganizar o território, reorganizar o planejamento das equipes e aparelha-las”, refletiu Ceci.

Além das unidades fechadas, a interrupção do trabalho de importantes profissionais, os Agentes Comunitários de Saúde (ACS), que trabalham na tarefa comunitária de educação e saúde e de acompanhamento das pessoas atendidas pela UBS, é também motivo de preocupação da enfermeira. “Os ACS são os agentes mais educadores das comunidades, foi assim na dengue. Eles são grandes atores da educação popular para a saúde, mas sem receber EPIs e treinamento adequado não podem ir aos territórios”, completou.

De acordo com Fábio, os agentes não receberam qualquer espécie de treinamento nos últimos 70 dias. O que é reflexo da falta de planejamento da gestão municipal no combate à doença. O trabalho realizado até o momento tem maior foco no enfrentamento à doença, como o hospital de campanha e não na prevenção. “O fechamento dos postos vai na contramão do combate ao problema, sem ações preventivas nas comunidades, sem investimento nas unidades básicas”, comentou Fábio Barros.

“Ao invés de fechar as unidades, têm que criar mais referências. Pegar uma escola no entorno dessas equipes para que sirva de referência a ações educativas, para otimizar também esse espaço público. Já é uma capacidade instalada de equipamentos e pessoal que precisa ser utilizada.”, sugeriu Ceci

É previsto que o município receba um recurso no valor de 33 milhões de reais do Governo Federal, mas se a postura de enfrentamento continuar a mesma não se pode esperar melhoras consideráveis do cenário. De acordo com a gestão, o adoecimento de 30% do quadro de profissionais foi o que resultou no fechamento das unidades. “Que a prefeitura possa contratar novos profissionais para substituir aqueles que estão afastados, mas não é aceitável que o sistema esteja parado, até porque outras doenças permanecem e têm influência direta na vida das pessoas”, cobrou o presidente da Câmara

“Atitudes preventivas em comunidades, que poderiam diminuir a propagação do vírus no ambiente doméstico e além disso preparar, orientar e medicar para enfrentar a possível condição de já estar contaminado. Isso diminuiria o número de pessoas contaminadas nas unidades de média complexidade e no hospital de campanha. Só o ato de medir a temperatura das pessoas já seria suficiente para contribuir no aumento ao combate à Covid-19 na contenção e na prevenção”, propôs Fábio

Além dessas medidas, Fábio e Ceci salientaram a necessidade de treinamento para os profissionais que trabalham nas unidades, mas que não possuem formação diante da necessidade do uso de EPIs e como se proteger da melhor forma. Aos profissionais da saúde, como médicos, enfermeiros e técnicos, por exemplo, na linha de frente do enfrentamento à doença foi reforçado a importância do acolhimento e acompanhamento psicológico.

“Nós temos unidades de saúde que não estão na linha de frente, saúde mental. As equipes dessas unidades, os CAPs, podem fazer um tipo de atendimento, tanto aos profissionais de saúde, quanto às famílias. Eles devem ser acolhidos, nesse momento em que existe uma angústia muito grande, o medo de sair de casa e ir trabalhar, e como ficam as famílias? A preocupação em contaminar a minha família, Como é que fica essa situação?” questionou a enfermeira.

 

Valorização dos profissionais

Para finalizar, Fábio relembrou a reivindicação das categorias profissionais da área da saúde sobre pagamento da taxa de 40% de insalubridade, como forma de valorização do trabalho prestado à sociedade. A garantia de saúde, segurança e qualidade de vida aos trabalhadores é a forma mais básica e mais essencial de enxergar a importância da função realizada.

“Valorização do profissional passa por tudo que a gente disse: capacitação; formação; EPIs; um bom programa; supervisão; uma boa gestão; integração; tudo isso é importante para que a saúde avance como política. Mas, não pode deixar de lado a falta de respeito manifestada na remuneração. Técnicos de enfermagem recebendo menos de um salário mínimo e mesmo com o acréscimo de vantagens não chega nem a 2000 reais.” disse.

A respeito da desvalorização da categoria dos técnicos, Ceci lembrou da sua trajetória de trabalho. “Como eu fui enfermeira que geralmente trabalhava com 30 pacientes em uma enfermaria e tinha três ou quatro técnicos de enfermagem comigo, eu aprendi são eles quem estão mais juntos do paciente. São eles que fazem a higiene, que andam com os pacientes, são eles que estão junto o tempo todo. Por isso, eu tenho certeza que o técnico de enfermagem está sofrendo muito, já vi muitas perdas de técnicos que me incomodaram muito, de médicos, de enfermeiros, de todos.”, desabafou Ceci.

No encerramento da live, Ceci ainda proporcionou um momento de emoção ao homenagear a sua profissão por meio de um poema. A importância da lavagem das mãos também foi reforçada por ela da mesma forma artística, o que resultou em diversas interações do público que acompanhou e participou da transmissão.